domingo, 28 de junho de 2009

terráqueos

Não sou vegetariano, mas depois de ver esse vídeo, penso que, ao comer carne, deveria ter pelo menos a preocupação de saber a origem dos alimentos que chegam à nossa mesa - algo difícil de descobrir hoje em  dia, ao comprar carne num supermercado, por exemplo. 

Creio que precisamos voltar - ou avançar - a uma fase da nossa cultura/civilização em que conhecíamos toda a cadeia de produtores, fornecedores e intermediários do que comemos e consumimos.  Perdemos esse link, e com ele perdemos nossa humanidade. 

Este vídeo contém cenas reais de crueldade com animais, mas precisa ser visto, para termos pelo menos consciência de nossos atos, cada vez que ingerimos carne animal. 




Se não abrir no google vídeo, que demora para carregar, também pode ser visto no youtube, em nove partes - eis o link para a primeira parte: http://www.youtube.com/watch?v=VADrTscciHA



quarta-feira, 17 de junho de 2009

relações e desejos

Nada pode ser mais desafiador na vida do que estabelecer relações com os outros. Quanto mais próxima a relação, maior o confronto com nossos próprios medos e vazios da personalidade. Mas que fazer? Afinal, não será essa a nossa principal fonte de ensinamento e talvez mesmo a razão da existência?

Muitos de nós, quando começamos um relacionamento, cometemos o erro essencial: tentamos barganhar. Algo como "eu te amo se você me amar de volta". E ficamos na expectativa de que o (a) parceiro (a) vai demonstrar, por suas ações e palavras, que corresponde ao que esperamos, que é sermos amados. Essa é a fórmula do desastre. Na nossa ânsia implacável pelo desejo de receber (prazer, atenção, amor, qualquer coisa menos indiferença), tornamo-nos vulneráveis às nossas próprias feridas e esquecemos que o mais importante, em qualquer relacionamento, não é o que vamos receber em troca, mas o que temos a oferecer, a dar, sem esperar retorno.

Amar não é um negócio. Casamento, sim; relacionamento, não. Mas é muito difícil deixarmos de lado a nossa expectativa de que, finalmente, encontramos alguém que vai suprir as nossas necessidades crônicas, algumas que carregamos desde a infância, ou quem sabe desde outras vidas, um ser-objeto que vai preencher nosso vazio existencial, vai fornecer-nos prazer ilimitado e infinito, eterna bonança, segurança e estabilidade na vida.

Em essência, essa postura revela uma característica de todos nós, seres humanos: somos buscadores irremediáveis do prazer a qualquer custo, tais como vasos a serem preenchidos com objetos do nosso desejo. Muitas vezes, achamos que vamos preencher nosso vaso comprando, comprando, consumindo. Outras vezes, comendo. Ou fumando, ou jogando, ou fazendo sexo. E todas as tentativas de preencher nosso vaso terminam sem nos trazer o resultado que desejamos. Compramos até endividarmo-nos sem limite, ou até o limite do cartão de crédito, só para depois vermos que 90 % do que adquirimos, no fundo passaríamos muito bem sem. Vimos uma torta de chocolate e desejamos comê-la inteira. Duas fatias depois, já nem mais podemos olhar para ela. Quem fuma, algo deve ver de muito atrativo no cigarro, até que percebe que o desejo não mais lhe satisfaz. Uns param (que bom!), outros partem para vícios mais pesados, sempre na eterna busca de satisfazer algo que nem sabem o que é. Com o jogo ou o sexo, não é diferente. Claro que o sexo pode ser maravilhoso, e é em certas condições, mas quando vira uma amarra, uma compulsão que visa unicamente satisfazer esse vazio cuja profundidade se desconhece, pode também escravizar, limitar, encapsular a vida.

Enquanto passamos por essas experiências de dar vazão ao desejo, de buscar a saciedade a qualquer custo, não raro encontramos alguém que nos desperta algo diferente, profundo, instigante. Queremos mais, passamos a orientar nossas antenas do desejo para a companhia, a atenção, o toque, o amor. É neste momento que tendemos a nos comportar como fazemos com todo objeto do desejo: buscamos a nossa saciedade, achamos que ele/ela está ali para nos satisfazer, tem essa obrigação, entramos no jogo da sedução com benefícios, da esperada troca de prazer que na verdade esconde a necessidade profunda de preencher aquele nosso vaso interior que não conseguimos encher nem com compras, nem com comida, nem com cigarro, nem com jogo, nem com sexo. É inevitável que isso leve ao fim da relação, às vezes antes mesmo de começar.

Passamos, então, a outra fase: a da vergonha. Sentimo-nos envergonhados do egoísmo que demonstramos, da falta de sensibilidade para como o(a) outro(a), quando percebemos que a relação afundou por causa do abismo de nossos desejos não satisfeitos. A vergonha nos faz tampar o vaso, fechar nosso coração, impedir que qualquer novo desejo por relações se manifeste. Temos vergonha de só querer receber, mas já é tarde, não há como voltar. Ou nos fechamos de vez, ou voltamos aos desejos mais materiais: compras, comida, sexo sem compromisso.

Uma relação evoluída, iluminada, com chances de durar, requer dos(as) parceiros(as) rever essa lógica perversa de tratar o outro como o objeto do desejo. Exige que tomemos consciência de que amamos não como meio de buscar a própria satisfação egoísta, mas sim como ato de entrega, de crença na vida, de lance sem retorno, de partida sem olhar para trás. Tornamo-nos, assim, vasos que refletem o desejo mútuo de dar prazer, e ao adotar essa perspectiva de entrega total, descobrimos que amamos não para nós, mas para o outro. Continuamos, sim, nutrindo as necessidades dele/dela, porque é daí que passamos a tirar o nosso prazer, e esse abraço pelo doar-se impulsiona uma espiral ascendente e iluminada pela nossa nova postura diante da vida, inspirada no desejo de dar e não no de receber a qualquer custo.

Este é, como disse no início desse texto, o maior desafio da vida. Mas quem disse que seria fácil? A alternativa é continuarmos imersos no torpor do consumismo, da gula, da luxúria ou da jogatina. Não quero que me entendam mal, não há juízo de valor quanto à opção por qualquer dessas coisas. O melhor da história é que somos livres para optar. Mas o nosso desafio continua sendo transformar o que nos move, partir de um desejo material e narcisista, até chegarmos a um desejo de profunda conexão com o que de mais puro e elevado pode haver na existência, que é o desejo de amar de verdade, sem condições nem barganhas.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

a civilização e seus descontentes


A Coréia do Norte acaba de realizar uma explosão atômica. O Irã recém testou míssil de longo alcance e declara que não abrirá mão do seu programa nuclear. Somália e Guiné-Bissau perderam suas estruturas de Estado e estão à mercê de saqueadores, piratas e traficantes.  O Paquistão precisa usar o exército contra seu próprio povo, para conter aquela parcela que viu no radicalismo talibã a única salvação. Bento XVI mantém a igreja na condenação do controle da natalidade, da homossexualidade, do aborto, das pesquisas com células-tronco. A crise econômica fez baixar névoa densa no horizonte da globalização. O México perde mais de 8 % do PIB, sem contar ainda os efeitos da gripe suína (oops, da gripe A h1n1). Fora os otimistas de plantão, ninguém é capaz de prever o fim da crise nem o quanto ela afetará a distribuição de poder e riqueza no mundo. A ciência concentra atenção na mudança do clima e busca respaldo político para empurrar tecnologias verdes e energias renováveis. As novas visões do espaço, obtidas de sondas, satélites e telescópios superpotentes, lançam mais incertezas sobre o que pensávamos conhecer do Universo. 

Este poderia ser um breve retrato da aventura civilizatória hoje. O mundo está mais inseguro, mais violento, mais incerto, mais à deriva do que jamais esteve. E, no entanto, nunca vivemos tanto nem tão bem, nunca tivemos tanto acesso ao conhecimento, ao consumo, ao prazer. Nunca nosso leque de opções foi tão amplo, ao ponto de podermos escolher se frequentamos missas ou orgias, raves ou almoços de família, shoppings ou caminhadas ecológicas, museus ou montanhas-russas, escolas ou lan houses, ou ambas, ou todas as opções e muitas outras, cada qual à sua hora. 

Mas estamos contentes? Era esse o almejado produto da civilização? Foi para isso que se sacrificaram vidas, que se eliminaram povos, que se massacraram inocentes, que se encarceraram irmãos? Tudo para que tivéssemos o gostinho de sabermo-nos livres - ainda que poucos dentre nós pudéssemos traduzir essa liberdade em ação? Por que a grande maioria das pessoas infelizes, depressivas, solitárias e mal-humoradas são justamente as que vivem nos países mais avançados? O que ainda falta para nos contentar? Quem se pode dizer, hoje em dia, plenamente realizado? 

Tudo leva a crer que estamos numa encruzilhada civilizatória e que uma escolha coletiva terá de ser feita, brevemente, sobre o rumo da humanidade, uma dessas que encerram eras e refundam estruturas. O problema é que se não tivermos consciência de nossas opções e não soubermos fazer as escolhas corretas, o processo de mudança será doloroso.  As turbulências que vemos no mundo - políticas, econômicas, éticas, morais, psicológicas - podem ser vistas como sinais de que essa mudança está perto - ou já terá começado, e nem percebemos porque quem está no meio da tempestade não consegue ver o tamanho do furacão. 

Com dor ou sem dor, o certo é que mudamos, e mudamos rapidamente, numa avalanche de fatos e situações que nos deixam sem chão, sem referências, sem norte. A menos que tenhamos a habilidade de adotar a postura correta: que possamos, individual e coletivamente, assumir visão integral da nossa existência, e que preparemos, assim, o parto de uma  nova consciência civilizatória, fundada em valores evoluídos e iluminados, frutos de percepção revisada do que significa estarmos vivos, estarmos aqui, habitarmos esse planeta e sermos parte do Universo. A todos os descontentes da civilização, essa parece ser uma reflexão necessária e inadiável. 


domingo, 17 de maio de 2009

gripe suína

A pandemia de gripe suína está servindo para revelar, pela via do sofrimento, que estamos mais conectados, em escala global, do que podíamos supor. A imprensa parou de dar tanto destaque ao assunto, mas a infecção continua a se alastrar, mais rápido do que os agentes de saúde são capazes de detectar novos casos, limitados à capacidade dos laboratórios de processar os exames para identificar o vírus. E a chegada do inverno no hemisfério sul traz o risco de um grande aumento no surto dessa doença, contra a qual não há resistência natural. 

Mas existe uma doença que é bem pior do que esta. Já tomou conta da humanidade toda e, para vencê-la, será necessário mais do que uma nova vacina. É doença  da indiferença, causada pelo vírus do egoísmo, propagada pela ilusão da separatividade. 

Estamos todos cada vez mais próximos, pelas comunicações, pela Internet, pelos transportes. Ao mesmo tempo, nunca estivemos tão distantes, cada um de nós encolhido na sua crisálida, com medo de um mundo que parece tão cruel, violento e assustador. 

Escolhemos não mais olhar para o sofrimento alheio, criamos filtros para vermos só o que interessa aos nossos propósitos egoístas e seguimos buscando a satisfação, a qualquer preço, de nosso próprio desejo de receber prazer. O resto que se dane. 

Às vezes, temos uma incômoda sensação de que essa nossa postura egoísta possa contribuir para os males do mundo, para a existência da fome, da miséria, da violência. Mas logo fechamos os olhos a essa possibilidade, porque "olhar para o monstro" não é uma atitude fácil, requer coragem e discernimento, então é preferível continuar culpando os políticos e os marginais e olhar para o "sistema" com a indiferença de quem dele não participa, por ele não é responsável, não está nem aí. 

E foi justamente essa indiferença que contaminou o mundo, alastrou-se em pandemia por todos os continentes, continua a manter-nos separados por uma barreira tão sólida quanto os muros de nossas casas, que nos dão alguma ilusão de segurança, ilusão essa com a qual preferimos continuar nos enganando. 
 
Se um dia superarmos o vírus do egoísmo, veremos que a mesma vida que surge e se manifesta em mim também existe em você e em todas as criaturas vivas. Talvez então possamos compreender que nada mais somos do que partes de um processo maior, de uma consciência universal e infinita, que se desdobra em constante processo evolutivo, do qual somos apenas um aspecto, tão importante quanto qualquer outro ser em que o mistério da vida se manifesta. 

Se quisermos adquirir essa nova consciência, precisaremos, em algum momento, deixar de nos vermos separados, isolados, com medo uns dos outros, reativos e reticentes à mera ameaça que possa questionar nossa instável ilusão de equilíbrio e conforto. Talvez nesse momento surja em nós um desejo de doar, que seja maior do que o de receber, que nos faça agir em função do que nós podemos oferecer ao mundo, mais do que dele extrair, que substitua em nossa psiqué o egoísmo pelo altruísmo, o desejo de separação pelo desejo de comunhão, a indiferença pela solidariedade. 

Quem sabe, então, possamos curar a Terra de todos os males. 

sexta-feira, 8 de maio de 2009

eixos



Em ordem de magnitude, ainda não chegamos no limite do menor nem do maior, se é que esse limite existe. Tome um átomo, por exemplo. Já se sabe que o interior do átomo é um grande vazio, e mesmo assim ele tem diversas partículas ainda menores (cerca de 16 comprovadas até agora). Prótons, nêutros e elétrons são as mais conhecidas. Enquanto prótons e nêutrons se aglomeram no núcleo do átomo, os elétrons desenvolvem órbita ao redor desse núcleo, o que faz supor a existência de um eixo central no átomo, em torno do qual eles todos se orientam. O eixo não é visível, não é outra partícula, nem alguma força subatômica que impede os elétrons de abandonarem livremente os núcleos atômicos. Mas o eixo pode ser imaginado e matematicamente deduzido. Na verdade, sem um eixo de referência, fica difícil conceber a estrutura atômica.

Um elétron, por sua vez, tem eixo próprio, que o faz girar em torno de si mesmo, tal qual a Terra e os planetas obedecem ao movimento de rotação. Ou as estrelas, como o nosso sol, que além de expandir-se em ondas de luz e calor, também giram em torno de si próprias. Recentemente, descobriu-se que a galáxia também tem um eixo em seu centro, no qual se comprovou haver um buraco negro, fonte de atração gravitacional que impede que sistemas solares como o nosso saiam à deriva pelo imenso e vazio universo.

Uma árvore tem um eixo, sobe desde o centro da Terra em direção ao espaço infinito, e sua estrutura orgânica se desenvolve em torno dessa linha imaginária que perpassa o seu centro de gravidade. Se observarmos bem, todo ser vivo tem um ou mais eixos que descrevem simetrias, reflexos e campos de energia. 

No plano simbólico, também temos cada um de nós um eixo, em torno do qual desenvolvemos nossa própria concepção da existência. O desenvolvimento da percepção, da linguagem, da consciência individual segue um vórtice espiral ascendente, que se expande em torno desse eixo invisível, no mais das vezes inconsciente, porém absolutamente imprescindível para a agregação dos átomos e moléculas em tecidos e órgãos que de forma harmônica se reúnem nessa sinfonia em constante recriação, e que nos dá o mistério da vida.

Poderíamos facilmente supor a existência de um único eixo, reproduzido em múltiplas dimensões da realidade e do pensamento, mas sujeito a uma só lei, que no plano físico se manifesta nas forças de atração gravitacional e de expansão universal. Poderíamos também supor que, no plano simbólico, o eixo da vida seria a referência tanto para a força centrífuga de expansão da consciência quanto para a força centrípeta que nos mantém com os pés no chão, fixos na realidade do tempo-espaço que agrega, reduz, realiza toda a experiência humana. 

Não será, enfim, toda a realidade, ou a árvore da vida, nada mais do que um eixo que tudo agrega, do microscópico ao intergaláctico? E nossa missão de vida, não será ela sintonizar, seja por intuição seja por vontade, com o eixo que em tudo se manifesta, e cujo destino seja realizar a si mesmo, também por nosso intermédio?

Você já parou para pensar qual é o eixo da sua existência? Qual a linha que, independente das intempéries e vicissitudes do mundo, descreve o caminho de onde você vem e para onde vai, sem limites de tempo nem espaço? Será que seu eixo está em sintonia com o eixo do planeta? do sol? da galáxia? Os átomos que compõem o seu organismo vibram também nessa mesma sintona? Sua mente é capaz de parar uns segundos e permitir que você se refugie, pelo menos por alguns instantes, na solidez, na imutabilidade, na verdade absoluta do eixo da sua vida?

quarta-feira, 6 de maio de 2009

pensamento


Esse texto de Bertrand Russell me acompanha há muitos anos. Considero-o como uma chave para inquirir, investigar, ampliar os horizontes do pensamento e, com eles, da realidade. 

"O homem teme o pensamento como nada mais sobre a terra, mais que a ruína e mesmo mais que a morte. O pensamento é subversivo e revolucionário, destrutivo e terrível; o pensamento é impiedoso com os privilégios, com instituições estabelecidas e com hábitos confortáveis. O pensamento é anárquico e indiferente à autoridade, descuidado com a sabedoria curada pela idade. O pensamento espia o fundo do inferno e não se amedronta. Ele vê o homem como um frágil graveto circundado por desmesurados abismos de silêncio. Não obstante, ele se porta orgulhosamente, imutável, como se fosse o senhor do universo.O pensamento é grande, ágil e livre,é a luz do mundo e a verdadeira glória do homem. Mas se for para fazer do pensamento a possessão de todos e não o privilégio de alguns, nós teremos que acabar com o medo. o medo que restringe o homem.Medo de que suas crenças queridas se revelem como ilusões, medo de que as instituições pelas quais vive se provem maléficas, medo de que ele próprio se reconheça menos digno de respeito do que sempre supôs ser. Deveriam os trabalhadores pensar livremente sobre a propriedade? Então o que aconteceria conosco, os ricos? Deveriam os jovens pensar livremente sobre sexo? Que aconteceria então com a moralidade? Deveriam os soldados pensar livremente sobre a guerra? O que aconteceria então com a disciplina militar? Abaixo o pensamento! De volta às sombras do preconceito, sem o que a propriedade, a moralidade e a guerrra estarão ameaçadas. É melhor que os homens sejam estúpidos, indolentes e opressivos, do que sejam seus pensamentos livres. Pois se seus pensamentos se tornassem livres , eles poderiam não pensar como nós. E a quaquer custo , esse desastre deve ser evitado. "

( Bertrand Russel )

Fonte da imagem: http://www.toptenz.net/top-10-celebrities-who-read-their-own-obituary.php 

sexta-feira, 10 de abril de 2009

visão de mundo


O livro 'Cosmos and Psyche", de Richard Tarnas, é um daqueles que abre horizontes. Estou ainda nos primeiros capítulos, e não resisto a compartilhar, desde logo, algumas idéias que enriquecem tremendamente o modo de olhar para o mundo à minha volta.
Segundo Tarnas, pode-se dizer que há, hoje, duas visões de mundo, ambas igualmente humanas, que definem nossa percepção da realidade: a visão materialista, antropocêntrica e desencantada que provém do Iluminismo e a visão romântica, cosmocêntrica e integral que tenta emergir nesse começo de milênio. 
O Ocidente ainda terá que chegar a termo com o paradoxo criado por essas duas visões, aparentemente irreconciliáveis. Por um lado, avançamos no conhecimento científico e objetivo do cosmos, na complexidade dos sistemas de organização econômica e social, no aproveitamento dos recursos naturais, ao ponto de nunca termos vivido em condições tão favoráveis, e tão superiores às demais espécies do planeta. Por outro lado, esses mesmos avanços permitiram o crescimento sutil mas inexorável de uma grande crise, uma crise que vai muito além do plano econômico e financeiro, atinge também os sistemas ecológico, psicológico e espiritual que construímos ao longo dos séculos. Ao privilegiar a razão e o progresso, separamo-nos do cosmos; assumimos a exclusividade da consciência e daí partimos em nossa trajetória de domínio e poder sobre tudo o que há à nossa volta. 
Uma visão de mundo não é apenas o modo pelo qual olhamos ao nosso redor. Ela também nos atinge internamente e define o modo pelo qual nos vemos a nós mesmos. Nossa visão de mundo configura nossa experiência psíquica, impõe os limites da nossa realidade, influi nas nossas escolhas éticas, define os padrões de nossa sensibilidade, conhecimento e interação com o mundo. A mente moderna e o raciocínio lógico e racional pressupõem uma divisão fundamental entre o ser humano, dotado de subjetividade, e o resto das coisas, existentes num mundo externo a nós, impessoal, objetivo. Todo o cosmos é visto como uma vasta experiência inconsciente, nada mais é do que matéria em movimento, funciona de modo mecânico, sem qualquer propósito, governado pelo acaso e pela necessidade. Enquanto o homem é consciente de sua própria inteligência, nega a inteligência a todo o resto. Ao fazê-lo, separa-se definitivamente do meio que o cerca, e vai além: subjuga-o, analisa-o fria e metodicamente, extrai dele o que necessita para seu próprio prazer e poder. 
Uma outra visão de mundo, no entanto, é possível, e tenta emergir nesse começo de milênio: uma visão que busca incorporar nos processos humanos também o inconsciente, o simbólico, o intuitivo, o arquetípico. Essa visão seria empurrada por um desejo profundo do próprio ser humano de reintegrar-se ao cosmos, de superar a fragmentação e a alienação da mente moderna. Haveria hoje um ímpeto em favor da reconciliação entre o homem e a natureza, o self e o mundo, o espírito e a matéria, a mente e o corpo, o consciente e o inconsciente, o pessoal e o transpessoal, o secular e o sagrado, o intelecto e a alma, a ciência e as humanidades, a ciência e a religião. 
É interessante observar que, historicamente, a visão materialista surge no momento em que Copérnico apresenta sua nova cosmologia. Ao retirar a Terra do centro do Universo, alterou a natureza essencial da realidade e alienou também a alma do mundo (anima mundi). Ao descobrirmo-nos um mero acaso na vastidão do Universo, percebemo-nos abandonados à própria sorte, no silêncio de um imenso vazio cósmico, cujo propósito é totalmente desconhecido e, talvez, inexistente. É essa percepção que determinou todas as construções humanas dos últimos cinco séculos: toda experiência religiosa, toda imaginação humana, todos os valores morais e espirituais foram a ela submetidos e reduzidos a idiossincrasias da condição humana. 
No entanto, nem por isso deixamos de ter intuição, sensibilidade estética e moral, imaginação criativa, apreço pelo amor e pela beleza, música e poesia, reflexões e experiências metafísicas. Esses atributos nos levam a uma permanente tensão e contradição conosco mesmos, já que a experiência subjetiva não pode ser medida, objetivada, cientificamente tratada.  O que está por detrás de toda essa polaridade é o desencanto com um cosmos sem propósito. Levado a extremos, essa visão trata o próprio ser humano como um mero objeto resultante de forças materiais e causas eficientes, um peão sociobiológico, um gene egoísta, um artefato biotecnológico. 
Para tentar superar essa aparente contradição entre o mundo objetivo e a experiência de subjetividade, é preciso reabrir questões mais profundas sobre nossa própria natureza e o modo como compreendemos o mundo; é preciso questionar a visão de mundo prevalecente desde Copérnico. É preciso entender mais claramente qual o papel de nossa subjetividade na vastidão cósmica, como essa subjetividade participa na configuração do Universo tal como o percebemos. É preciso retornar ao ponto original da cisão entre cosmologia e psiqué. 
Mal consigo esperar o próximo capítulo... 


segunda-feira, 6 de abril de 2009

como transcender a pós-modernidade?

Acabo de voltar de um retiro de fim de semana em Lenox, Massachusetts, com Andrew Cohen (foto), o guru americano da pós-pós-modernidade. Foi uma experiência fascinante, ainda tenho que digerir tantos conceitos revolucionários de quem está engajado em criar a consciência para uma nova era, que transcenda a pós-modernidade, esse período caracterizado pelo narcisismo, nihilismo, exacerbação do ego e separatividade. A visão de Andrew é fascinante, descreve o processo evolutivo da consciência como parte de um processo maior, cósmico, infinito, um impulso evolutivo primordial que se desenrola desde o Big Bang e prossegue no ato de criar a si mesmo por intermédio das nossas próprias consciências individuais. Seu ensinamento nos reposiciona diante do cosmos. Retira-nos do centro, porém mantém nossa importância essencial a todo o processo, porque o caminho da evolução se daria pela emergência de uma consciência coletiva, transpessoal, da qual somos veículos, e pela qual temos total responsabilidade. 
Registrei minhas impressões em outro blog, para iniciados e interessados em assuntos de consciência e evolução. Quem tiver interesse, pode ler na íntegra em para crescermos juntos

sábado, 14 de março de 2009

como tornar-se um iluminado nos dias de hoje?

O projeto EnlightenNext, que edita revista com o mesmo nome, lançou neste ano, nos Estados Unidos, a iniciativa chamada "O Ciclo do Descobrimento" (Discovery Cicle). Os participantes do projeto, chamados "evolucionários", reconhecem que tudo o que existe se manifesta ao mesmo tempo num plano interno e noutro externo. O plano interno seria a consciência, e incluiria as idéias e valores que temos da realidade, tanto individual quanto coletivamente. O plano externo seria a cultura, e consistiria no modo pelo qual nos comportamos em relação a nós mesmos e em relação aos outros, e também as estruturas físicas e sociais que criamos para organizar a atividade humana.

Segundo essa visão, a evolução do ser humano ocorre simultaneamente nesses dois níveis. As pessoas têm a capacidade de, por meio de seu próprio esforço, individual e coletivamente, promover a evolução tanto no nível interior (consciência) quanto exterior (cultura), ou em ambos, em busca da iluminação.

Este é um resumo muito simplificado de uma corrente de pensamento inovadora, que busca a integralidade e a realização na vida, sem necessariamente demandar o afastamento da realidade, a renúncia às atividades mundanas. Pelo contrário, é a experiência humana, na sociedade, na família, no trabalho, que forma a base para o engajamento daqueles que pretendem promover a evolução das relações entre as pessoas, com o meio ambiente, e também internamente, para aqueles que estão à procura de uma compreensão mais espiritual para o sentido da existência. Tudo está relacionado à consciência, que por nosso intermédio se manifesta, torna-se una, realizar a si própria por meio da experiência da vida.

O Ciclo do Descobrimento consistirá de uma sequência de eventos em 2009 e 2010 que visam a gerar momento para que a humanidade atinja condições de avançar para o próximo nível da evolução, no processo duplo e continuo de realização do ser e do tornar-se (being and becoming). Este ciclo prevê três semanas de retiro com Andrew Cohen na Toscana, Itália, em julho de 2009, e uma Conferência Mundial em Londres, em 2010. O retiro terá por objetivo o trabalho interior de preparação da consciência para essa espiral evolutiva. A Conferência seria o aspecto externo, cultural, da consciência aplicada às diversas manifestações sociais e experiências humanas.

Quem se interessar e quiser saber mais pode acessar o site http://www.enlightennext.org/ (em inglês).

sábado, 7 de março de 2009

felicidade interna bruta



"Felicidade Interna Bruta" é mais importante que "Produto Interno Bruto".
(frase atribuída ao Rei do Butão)


Se pedirem para você responder à pergunta: o que é mais importante na vida, o dinheiro ou a felicidade? O que você escolheria?

Se a sua resposta foi felicidade, como suponho seria a de quase todo mundo, então por que temo
s tanto zelo em inventariar nossas finanças, somar a riqueza que produzimos, descobrir qual o nosso Produto Interno Bruto, mas não nos preocupamos com uma estatística da felicidade, um índice que demonstre - e compare - quão felizes nós somos, coletivamente?

Bem, há alguém que se preocupa com isso. O rei do Butão decidiu, desde os anos 1980, que seu país não seria mais avaliado pela capacidade de gerar riqueza, mas pelo grau de felicidade com que as pessoas vivem suas vidas.

Pensando bem, por que não? Afinal, se chegarmos à conclusão que a felicidade é mais importante que a riqueza material, por que não medi-la e, a partir daí, criar ações para aumentá-la? Por que não avaliar nossa prosperidade pela medida em que formos capazes de ser felizes, vivermos em estado de comunhão, transmitirmos essa felicidade aos que nos cercam?

Se fôssemos medir o índice de felicidade no Brasil, qual seria? Não estamos longe de fazer esse exercício: já se iniciou em São Paulo um movimento social em favor do FIB - o índice de Felicidade Interna Bruta. Teve até uma conferência nacional em outubro de 2008, em São Paulo e Campinas, e em breve será feita no Brasil a conferência internacional sobre FIB. Veja o site-blog aqui e os vídeos no YouTube aqui (parte 1) e aqui (parte 2).

Veja também essa chamada da Icatu Hartford sobre o FIB:




Foto do início: Reino do Butão, Trongsa Zdong, por Bob Witlox.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

aurora profana


Aurora Profana

A vista a estrada alcança, avança
Densa mata escura augura
Fé constrói, corrói, destrói
Em ti na longa ida pensa

Quando sobre a mata plana
Fugaz sentido em si levanta
Breve som primórdio ecoa
Lava, cria, faz constança

Visão, o vão sentido, embaça
Calor e dor a mão engana
Da rosa aroma desvanece
Nem cor, sabor, odor revela
A tua aurora profana

A roda gira, a alma dança
Temor ausente inspira a paz
A mente tenta sem lembrança
Final sem ti não há
À existência. 


Revirando manuscritos, encontrei essa poesia aí, que escrevi há um ano, logo antes de deixar Brasília. Como blogs também se prestam a essas coisas, resolvi compartilhá-la aqui. Espero que tenham gostado. 


sábado, 7 de fevereiro de 2009

a hora de Noé


Com tantos furacões, inundações, tsunamis, terremotos, derretimento de calotas polares, elevação das marés; com a deterioração do sistema financeiro, que atingiu em cheio o coração da economia capitalista globalizada e ainda pode contaminar os sistemas de poder, com conseqüências imprevisíveis; com os buracos na magnetosfera, que deixam nossos sistemas de comunicação e transmissão elétrica vulneráveis a tempestades solares; com o ressurgimento da pirataria no golfo de Aden (em pleno século XXI !); com a fome, a miséria e as doenças ainda dizimando populações inteiras; com tudo isso, não teríamos chegado na hora de um novo Noé aparecer no mundo, disposto a resguardar a vida em meio a águas turbulentas, e assim atravessar essa fase de destruição que parece já ter começado? 

Falo em Noé no sentido figurado, porque ninguém imagina um velhinho barbudo carregando numa arca casais de todas as espécies para, depois da tempestade, voltarem a povoar a Terra, mesmo que alguns tenham levado essa história ao pé da letra e tenham de fato iniciado essa tarefa, como na construção do bunker com sementes da maior variedade possível de espécies vegetais, em Svalbard, Noruega, que se faz com o apoio do governo norueguês e do Bill Gates. Mas não falo disso. 

Falo em linguagem simbólica, falo de atitude, da escolha que podemos fazer entre protestar contra um gigante, como fez David, ou talvez preparar para liderar uma comunidade através da crise que se aproxima, já é visível e será forte e duradoura, como fez Noé. Falo de mirar o futuro e salvar o que for possível para retomar a vida, passada a tempestade. Para tal, será preciso optar pela criação de algo novo, ao invés de confrontar o antigo. Algo mais voltado para a "proposição" e menos para a "oposição". Quais seriam os princípios de Noé, se optássemos por seguir seus passos?

Menos problemas, mais soluções
Ao definir seu grupo, coalizão ou organização com a orientação de resolver um "problema", você estará minando seus esforços pela negatividade. Saber o que ou a quem somos contra não é suficiente na visão de Noé. Para salvar o planeta e seus habitantes, precisamos também saber o que somos a favor, e a isso direcionar nossas energias. 

Menos demandas, mais metas
Cada vez que formulamos nossos desejos como "demandas", assumimos uma relação de adversários do mundo à nossa volta: reconhecemos que não temos algo, e temos de lutar para obtê-lo. Nessa fase de transformação catastrófica, será que construir adversários ajuda? A alternativa é reformularmos nossas demandas em "metas". Metas podem ser compartilhadas, podem reunir apoios em torno de uma causa, e mesmo que divergências pontuais sejam inevitáveis, podem tornar mais fácil a tarefa de construir um futuro comum. 

Menos alvos, mais parcerias
O mundo é feito de grandes batalhas, mas para vencê-las é mais importante criar rede solidária de parcerias do que fixar-se na destruição do "alvo" inimigo. Se você entrar numa situação qualquer à procura de um inimigo, o encontrará facilmente. Nessa época pré-cataclismática, nosso desafio é encontrar e reunir nossos amigos, e isso é mais importante do que tentar derrubar os inimigos. Para enfrentar as mudanças em curso, precisamos voltar uns aos outros, mais do que uns contra os outros. 

Menos acusações, mais confissões
Muitos dos inimigos que precisamos destruir, senão todos, estão dentro de nós. Nós também somos parte do "problema". Tentamos mudar o status quo, mas é dele que seguimos tirando nosso sustento. No fim do dia, acabamos alimentando o próprio monstro contra o qual queremos lutar. Aqui, é preciso ter uma dose de humildade: reconhecer que não estamos apenas lutando contra o poluidor lá fora, mas também contra o poluidor dentro de nós. Todos temos pequenos demônios interiores que poluem nossas mentes e nossos corações, turvam nossos pensamentos e distorcem nossas ações. Seríamos mais fortes se reconhecêssemos e confessássemos nossas fraquezas, nossos medos, nossas necessidades. A sua experiência de luta interior, para realinhar sua vida a propósitos maiores e mudar seu próprio comportamento, ainda que seja pontilhada de pequenos fracassos e recorrentes fraquezas, como acontece na vida de todos nós, é o que vai criar a empatia e a cumplicidade com aqueles que se quer conectar e firmar laços mais fortes e perenes para a travessia conjunta. 

Menos discurso, mais entrega
Você não pode salvar um país ao qual você não sirva. Você não pode encampar uma causa em que você não acredite. Você não pode liderar alguém que você não ame. O amor pressupõe a entrega. Não estamos sempre certos, não somos donos da verdade, somos apenas buscadores, como todos os outros seres desse planeta azul. Não podemos convencer mais as mentes, precisamos achar meios de falar aos corações. E só conheço uma receita: ser verdadeiro, entregar-se, amar. 

Você já parou para pensar na companhia de quem você gostaria de embarcar na Arca de Noé? O que você deixaria para trás, o que seria realmente indispensável ter com você? Não falo no plano material (eu bem que gostaria de levar o meu iPod...) mas no nível simbólico, arquetípico, imaginário, qual seria a sua melhor companhia para atravessar mares turbulentos? 



quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

ego

No texto que publiquei no solstício de inverno (do hemisfério norte), chamado Mordor, recebi alguns comentários sobre as referências que fiz ao ego e à necessidade de que ele seja aniquilado, como condição para o surgimento de consciência mais alinhada com nossos verdadeiros propósitos de vida, da mesma forma que Frodo teve de empreender a jornada heróica e sofrida para retornar o anel à lava vulcânica de onde havia sido feito, para lá derretê-lo.

Recebi alguns comentários em defesa do ego e achei que valeria a pena retomar essa noção. Achei noutro blog (The Cleaver) o seguinte trecho (tradução minha), que bem ilustra o que tento transmitir:

"Como se vestisse o quepe branco do capitão, o ego toma o timão, mesmo que ele não tenha a experiência suficiente para navegar. O verdadeiro trabalho do ego é cuidar dos impulsos de sobrevivência, tais como comer, beber, reproduzir, reunir-se em tribos, lutar ou fugir. Ele não está equipado para comandar uma nave grande e complexa. Consequentemente, faz uma série de erros, perde-se, avança sobre águas turbulentas e colide com outros egos. Com frequência, infringe dano em si mesmo e nos outros. Do mesmo modo, buscando justificar-se entre uma teoria ou outra, o ego só consegue alcançar resultados medíocres, se comparados com o comando magnífico e brilhante do self superior. Precisamos necessariamente convencer o ego a tomar o assento traseiro.
(...)
Ser quem você é não é nenhum vago sentimento da Nova Era. É uma disciplina rigorosa de trabalho pessoal para adquirir a consciência do presente. É uma trajetória espiritual natural. Ao trazermos nossa atenção ao momento presente, desconectamos os mecanismos egóicos da mente e a liberamos do fluxo da temporalidade. Saímos do loop do tempo (a terceira dimensão); a mente se torna imediatamente mais profunda e conectada (com a quarta dimensão). Esta é a jornada heróica do verdadeiro ser. Isso é filosofia, psicologia, espiritualidade, ciência e arte. É a realidade viva de observar nosso Dharma, nosso sagrado caminho pessoal, dia a dia, todos os dias.

Pensar e fazer são periféricos. Ser é tudo. Ser é agora. Isto é sabedoria antiga, profunda e autêntica. É o conhecimento que mais uma vez brota à superfície em milhares de mentes, retirando-as pouco a pouco da grande e recorrente amnésia da humanidade."

Não se trata, de fato de aniquilar o ego, mas de retirá-lo do comando, de compreender que existe uma força condutora nesse cosmos que é superior à nossa compreensão e que dela somos partes inseparáveis. Trata-se de deixar de lado a tola idéia de querer controlar tudo, dominar a natureza, saber-se senhor do universo. Não quero com isso desmerecer os avanços científicos que a humanidade logrou ao longo dos milênios. A mente racional, lógica, cartesiana, foi essencial para, desde o Iluminismo, alçar-nos ao patamar de consciência de que desfrutamos hoje. Parece-me, no entanto, que nossa evolução não para aqui e que o novo e significativo passo da humanidade dependerá menos do empirismo da ciência e mais da mudança de atitude e consciência interna a respeito dos fatos da vida. Essa é a mudança mais revolucionária que podemos almejar: a da nossa consciência. Se não formos capazes de ascender a um novo patamar de compreensão de nós mesmos e do nosso propósito aqui na Terra, se continuarmos a agir como consumidores hipnotizados pelos encantos materiais, se fecharmos os olhos às mudanças que se aceleram à nossa volta, como teremos condições de evitar a destruição total e o caos?

Bem, talvez
seja o caos parte indispensável da nossa aprendizagem, quem sabe? A malha da civilização está tensa, parece rumar para um ponto-limite, o ponto sem retorno, se é que já não tenhamos passado dele. O reordenamento da vida em torno de novos valores não se fará sem um período de caos e destruição. O apego ao ego, assim como às coisas materiais, só aumentará nosso sofrimento. Por isso, parece ter chegado a hora de empurrarmos o ego para o banco traseiro e entregarmos o controle da nave da nossa existência para o self superior, o self autêntico, o eu verdadeiro, ou como quer que o chamemos.


segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

mulher guerreira


Conheci a Val em Brasília, quando ela foi visitar o Moroni, antes de ele se mudar para a Nova Zelândia. Ela mantém um blog e fotos no multiply. Recebi este post dela, chamado A Minha Lição de Vida, e achei que devia compartilhá-lo aqui. A vida é dela, mas a lição é para todos nós.  A Val é uma mulher guerreira, que não se curva diante das adversidades da vida. Consegue encontrar coragem e resignação para continuar na luta, com paciência e fé. O texto dela, um pouco longo, é cheio de humanidade e verdade. Insisto que você entre lá e leia até o fim e conheça a história dessa fantástica mulher. 

domingo, 11 de janeiro de 2009

transformação

Você acredita que as mudanças no mundo estão acelerando-se, como se o próprio tempo passasse cada vez mais depressa? Tem essa sensação às vezes? Consegue perceber o que está mudando à sua volta?  

Na edição mais recente da revista Shift (1), há um artigo interessante e muito 
bem escrito, de autoria do psicólogo Edmund J. Bourne, sobre a aceleração das transformações em curso. O Dr. Bourne inicia com a idéia de que nossa civilização está diante de uma encruzilhada: não é viável prosseguirmos com nossas tendências de crescimento econômico e consumo material ilimitados. É como se a humanidade estivesse prestes a deixar a adolescência e dar-se conta de que precisa aprender a zelar pelos recursos do planeta. Pela necessidade de gerirmos a Terra de forma sustentável, a cooperação entre as nações terá de se impor e superará finalmente o conflito. Tais valores e inclinações já são hoje percebidos em cerca de 10 a 20 por cento da população mundial, mas só prevalecerão quando os desafios globais atingirem massa crítica. É por isso que os problemas que vemos hoje, derivados da mudança do clima, dos distúrbios ecológicos, da escassez de recursos (água, comida em algumas partes do globo) e da pobreza estão acelerando-se tanto: em breve, atingirão um ponto tal que irão forçar a necessidade de mudar drasticamente as prioridades de vida na nossa sociedade. 

No artigo, o Dr. Bourne apresenta uma lista de perspectivas que ajudam a acompanhar melhor o que está sendo alterado no paradigma da nossa consciência social: 
  • universo consciente: superação da visão mecanística do mundo, que passa a ser compreendido como um processo criativo, com atributos de auto-organização e intencionalidade, e ao qual nós estamos ligados de maneira integral; 
  • realidade multidimensional: passamos a reconhecer o real além dos limites do mundo físico, a existência de dimensões sutis que formam a matriz do universo físico que visualizamos;
  • interconexão: nossas mentes estão todas reunidas numa consciência coletiva. No nível mais profundo de nossas almas, nós somos todos um. 
  • complementaridade entre ciência e espiritualidade: ambos levam a uma compreensão do cosmos; a ciência, junto com as humanidades e as artes, aos aspectos subjetivos e simbólicos;
  • ética natural: o comportamento ético deriva da consciência interior, e não da moda ou dos padrões culturais;
A emergência desse novo paradigma de consciência afronta radicalmente a visão racional-materialista-consumista com a qual crescemos. A mudança é tão radical quanto a que o Renascimento trouxe à visão de mundo medieval. Retomamos uma imagem do cosmos que excede os limites da ciência objetiva. Essa transformação ensejará o surgimento de novos valores para a sociedade. Tais valores representarão o distanciamento da atual orientação materialista, rumo a uma orientação humanista-espiritual da vida. 

Quais serão esses novos valores? Que idéias representam melhor essa transformação? Não creio que se possa facilmente listá-los, nem esperar que alguém os apresente: elas emergirão na medida da evolução da consciência de cada um de nós. O que você acha? Isso é o mais importante.  

Referências:
Shifts - at the frontiers of consciousness. Revista trimestral publicada pelo Institute of Noetic Sciences (IONS). Edição nr. 21, dezembro/2008. 

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

guerra

A Faixa de Gaza entrou o ano sob bomardeio cerrado das forças israelenses. O conflito escalou-se para uma invasão por terra, ainda em curso. Esta é uma guerra que diz respeito a você, diretamente. Porque quando o mundo, inclusive você, celebrava o dia universal da paz, 2009 começou em guerra. E nada que pudesse evitar a perda de vidas inocentes foi capaz de contê-la. Nem a diplomacia, nem a democracia, nem o diálogo. O sistema internacional mostrou-se inepto: o Conselho de Segurança da ONU não logrou adotar decisão em favor de um cessar-fogo. O governo Bush, em fim de mandato, silenciou, e o presidente entrante não quis se antecipar.

Esse é só mais um movimento no intrincado jogo de xadrez do conflito do Oriente Médio, que não é de hoje. Israel contou com um vácuo de poder para adquirir mais uma posição de força, a partir da qual poderá negociar em melhores condições. É uma tentativa de aniquilar o Hamas, grupo considerado terrorista e portanto indesejado no governo palestino, apesar de ter sido democraticamente eleito em 2006. Há limites, portanto, para a democracia. A vontade popular pode escolher um governante do terror, e daí? Democracia, sim, desde que vença o meu candidato. Ou que o vencedor aceite as minhas condições. Nesse caso, as de Israel. Em troca, vai aceitar retirar-se de Gaza e voltar à situação em que se encontrava na véspera do bombardeio. Mas terá conseguido negociar melhor, com base na força, e terá no mínimo enfraquecido o Hamas. Mesmo que isso custe um milhar de vidas inocentes.

Vendo do outro lado, Israel só quer sobreviver, construir sua nação na terra de seus antepassados. Isso inclui não aceitar um governo vizinho que declare ter como principal objetivo aniquilar do mapa o "povo eleito". Os freqüentes bombardeios a Israel a partir de Gaza, comandados pelo Hamas, a partir de canhões escondidos em áreas densamente habitadas, escolas, asilos e hospitais, indicam provocação. Se sua própria sobrevivência está em jogo, é preciso lutar. Qualquer instinto tribal reagiria assim. Nesta guerra, portanto, não há como dizer com quem está a razão. A razão, aliás, se perdeu lá atrás, junto com o diálogo, a democracia, a diplomacia...

No duomilésimo nono ano da era cristã, é lamentável que a terra em que Cristo viveu esteja em conflito tão desumano, seja testemunha de tanto derramamento de sangue, veja esvair-se qualquer capacidade de entendimento e concórdia entre povos irmãos. Esta é uma guerra fratricida e desesperançosa. Demonstra como estamos longe de viver a paz, a harmonia e o entendimento como valores não-negociáveis, como se fossem leis naturais. Não sei se reagiria diferente, estando na posição de qualquer um dos lados, e você? Por isso, repito que essa guerra diz respeito a você, diretamente. Abençoados estamos, longe dos mísseis e da dor, ou amaldiçoados seremos, condenados a viver num mundo fratricida, onde a força vale mais que o argumento, onde a paz continua sendo um sonho distante.